Por Mário Vicente
O parlamento angolano impôs, como era de esperar, a sua carta magna que não se revê com os anseios da maioria dos cidadãos. Entre a imposição e o silêncio da oposição e da sociedade civil, a nova constituição não serve e tão pouco merece ser considerada como um instrumento do poder agora forçosamente instituído.
A política de cadeira vazia que a UNITA adoptou, foi criticada por individualidades ligadas ao poder.
Entretanto, a sociedade civil e entidades religiosas, com algumas reticências, colaram-se ao lado do MPLA. Ao certo não se sabe que desígnios salvaguardam. Em suma, já não há democracia. Voltamos para a ditadura, onde os discursos do chefe de Estado, que são documentos de estudo e símbolos do culto de personalidade, indicam que o país continua à deriva.
A nova constituição, plasmada no Projecto C - Presidencialista Parlamentar, foi aprovada por políticos do partido maioritário, sob o olhar atento e silencioso da co-munidade internacional. Muitas críticas estiveram a volta desta constituição que o MPLA orquestrou, ante o silenciamento e ausência da UNITA na sua aprovação. As reacções de vozes tidas como democráticas, vieram a terreiro condenando o partido do Galo Negro pela sua opção e aposta em não testemunhar o sufoco da democracia em Angola.
Entre figuras políticas e religiosas que a imprensa nacional fez referência, as ilações apontam para mais um golpe constitucional, mas que cobardemente não foi divulgado como tal.
Entretanto, a UNITA, ao ser acusada como mentora de falta de responsabilidade política, reagiu de imediato as acusações que lhe foram imputadas e claramente mostrou exemplos colhidos nas democracias ocidentais, onde a política de cadeira vazia é um item respeitado pelos parlamentares e não um ponto de reclamação, conforme o MPLA quis dar a entender no seu comunicado. Se democracia é li-berdade de expressão, filiação política, religiosa ou social e muito mais do que isso, a condenação do partido no poder deixa muito a desejar sobre os seus anseios. Como reacção a esta condenação, Isaías Samakuva emitiu o seu parecer, atacando com lições claras o partido no poder, que julga ser desconhecedor das regras democráticas. Se em desporto o anti-jogo faz parte do jogo, em democracia a política da cadeira vazia também faz parte da política e ponto final.
Entre a troca de palavras e documentos entre os dois partidos, ressalta por um lado a acusatória falta de sentido de Estado por parte da UNITA, que em resposta considerou como um insulto a política, que na sua visão procura sempre transformar o ofensor em vítima. Nos vários pontos que a declaração lida por Isaías Samakuva, e certamente do conhecimento do MPLA, deu a conhecer a opinião política nacional e internacional, ressalta um ponto curioso e em título garrafal faz referência a um caso que aconteceu na Rússia, que por sinal é um standard da política ideológica do MPLA.
Na referida carta, a UNITA referiu-se aos três grupos parlamentares de oposição na Duma, ou seja a Câmara Baixa do Parlamento Russo, que abandonaram a sala de sessões no passado dia 14 de Outubro do ano passado, em sinal de protesto contra o facto de o Partido da Rússia Unida se recusar a discutir a falsificação dos resultados eleitorais. A lição da declaração da UNITA é o culminar de várias alegações que tiveram início antes das eleições legislativas passadas e, em acto contínuo e paulatino, impingiu e condicionou o cumprimento de uma lei duvidosa, numa constituição ainda em estudo, mas que era do conhecimento da oposição quanto ao seu desfecho. Com violações metodológicas no seu funcionamento, a Assembleia Nacional violou os seus estatutos internos ao introduzir a Proposta C, que vai eleger o já eleito presidente do partido no poder, por tratar-se de uma figura baptizada como candidato natural de um partido que governa Angola a mais de 30 anos. Em resumo e a volta do processo constituinte que durou cerca de um ano, muita água passou debaixo da ponte na nossa Casa das Leis e muitos esqueceram-se que o elenco directivo do MPLA tem o carimbo testado pelo Presidente da República. Entre muitos golpes, imprecisões e vio- lações da carta magna, a UNITA ausentou-se da sala e foi pronta em responder que não é favorável a nova constituição.
Entre a falta de sentido de Estado, própria das democracias emergentes em África, coloca-se em questão a violação de princípios ideológicos, jurídico-constitucionais que limitam ou podem limitar o poder constituinte em todas as suas vertentes no alargamento do poder instituído na sua continuidade ou absolvição. Ao não parecer como proposta legal e mais adequada para o país, as consciências mantêm-se confusas sobre o novo modelo que o MPLA preparou para a nação, onde a centralização de poderes pelo presidente da república é inquestionável.
Os 31 anos do mandato de José Eduardo dos Santos como presidente do país, renovados anteriormente pela Assembleia do Povo e posteriormente por eleições que a UNITA sempre contestou, não passam de uma farsa constitucional e arbitrariamente contradizem os anseios dos angolanos.
Em prol deste imbróglio que se impõe na nova governação, cabe a Assembleia Nacional, ao presidente da República e outras instituições, respeitar as leis e fazê-las cumprir, obedecendo a uma nova governação onde o primeiro-ministro, como chefe do executivo, tem de dar mostras de governante e não uma personalidade figurativa como tem sido até então. Até a convocação das eleições presidenciais, os angolanos não conhecem o futuro imediato da sua história e não deslumbram com que governação nos vamos defrontar. Se ninguém está acima da lei, é imperioso que a consciência do cidadão sirva como muleta de opinião no debate das questões nacionais, com a devida transparência e opiniões inteligentes.
O parlamento angolano perdeu uma certa credibilidade em apostar nas maiorias, onde os numerosos têm razão, frase estranha e que deitou por terra políticos de capacidade reconhecida na conduta dos seus partidos. Falar ou propalar que o MPLA é o povo e o povo é o MPLA, a nova constituição em adágios populares recai na classificação do vampiro. Se é rejeitado pelos ratos por ter asas, também é rejeitado pelas aves por ter dentes. É como esta constituição que é mordente pela oposição e chupante pelo partido no poder e insalubre para a sociedade.
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