Seguidores

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

População vive sem esperança - Macocola esquecido no tempo e no espaço e o povo vive como se estivesse na era primitiva

Por: Simão Pedro

Quem deixa o município do Quitexe para se dirigir para o norte da província do Uíge, por terra, encontrará a localidade dos macocolenses, uma povoação na comuna de Macocola, no município de Milunga, que fica a sul do rio kuilo. A população desta localidade está esquecida no tempo e no espaço e vive como se estivesse na era primitiva, em pleno século XXI, como pôde constatar o ChelaPress.
Da sede da capital da província do Uíge até ao local, percorrem-se 220 quilómetros, mas para o efeito é necessária uma viatura todo-o-terreno, doutra maneira as coisas tornam-se muito complicadas, pois para população da comuna de Macocola o tapete asfáltico ficou para a história.
Aquela população está isolada do resto do país, quer por falta de estrada, quer por comunicação telefónica. O sinal da televisão e rádio não é visto nem ouvido, por isso o termo “informação” não faz parte do divinatório daquela gente humilde e acolhedora.
O percurso é feito numa picada, aberta no tempo colonial, e como se pode imaginar, vivem dificuldades de vária ordem.
Uma das terras mais famosas a nível mundial na produção de café, infelizmente este fruto deixou de ser produzido, pois o ChelaPress constatou centenas e centenas de sacos de café a apodrecer nas residências dos camponeses. Mas não é só o café. Também a ginguba, mandioca, arroz, feijão, milho e tantos outros produtos que não conseguem escoamento devido essencialmente pela falta de tapete asfáltico.
As trocas comerciais são feitas como na era das “comunidades primitivas”, ou seja, troca direta de produtos.
De acordo com o soba da aquela localidade, João Kendisse, um quilo de sal é trocado por dois ou três baldes de ginguba. Uma barra de sabão equivale a cinco baldes de ginguba. A ginguba, a par do feijão, da mandioca e do azeite de palma, funciona como a moeda local.
No capítulo da educação, embora existam duas escolas, das quais uma de pau a pique construída pela população da comuna de Macocola, e outra de estrutura moderna com oito salas, algumas sem carteiras, erguida pelo governo do Uíge, lecciona-se apenas até a 6ª classe por falta de professores qualificados, de acordo com declarações feitas ao ChelaPress por André Nicodemos, encarregado de educação.
“Há um tempo atrás, Macocola tinha mais de dez professores formados pela organização Norueguesa ADPP, que davam aulas e que recebiam como compensação algumas quantidades de azeite de palma, mas por causa do isolamento e sobretudo do incumprimento do governo do Uíge que prometia inseri-los na função pública e nunca o fez, foram desaparecendo um por um, comprometendo desta forma o sonho de muitas crianças de continuar a formação”, deplorou.
André Nicodemos reforçou que os alunos que terminam a 6ª classe “têm que emigrar para a sede da província ou Luanda para concluírem os estudos”.
Continuando, acrescenta tam-bém que, devido a este facto, poucos são os jovens que permanecem na comuna. Na verdade, durante os dias em que a nossa reportagem permaneceu em Macocola, as crianças, os jovens e os idosos contavam-se pelos dedos.
Porém, o que retratamos até aqui é apenas a “ponta do iceberg” da realidade de quem teve o destino de nascer naquela povoação.
A cada instante, alguém trazia histórias desoladoras para nos contar, histórias que apenas os mais fortes conseguiam conter as lágrimas.
No que se refere a saúde, por exemplo, existe apenas um posto médico, mas não tem medicamentos nem médicos, apenas seis enfermeiros asseguram assistência médica para uma comuna que tem mais de cinquenta bairros.
A medicação é feita à base de árvores, as mulheres gestantes chegam a morrer por falta de um comprimido, para não falarmos do acompanhamento que não faz cultura naquela comunidade da província do Uíge.
Quanto a água, é outro problema. O único rio próximo da localidade, rio nsamba, fica há dez quilómetros, por isso, como alternativa a população consome água das cacimbas visivelmente impura. Tem cor castanha!
No meio de todo o clamor, em Junho de 1999 foi constituída a Associação dos Naturais e Amigos de Macocola (ANAMA), organização que tem feito o que pode para mudar o quadro, mas que, segundo os locais, não encontra cooperação por parte do governo local.
Dentre os projectos da Associação dos Naturais e Amigos de Macocola (ANAMA), destaca-se a reconstrução da comuna, com infra-estruturas modernas que comporta novo posto médico, escola, moagem e um Centro Social.
Segundo o regedor, Nunes Kadissonda, todas estas dificuldades são o “pão-nosso de cada dia”. Trocando por miudos, significa que a Associação tem apresentado sempre as dificuldades do povo à administração municipal de Milunga, mas desta apenas saem promessas, atrás de promessas.
Cansados com a situação, e alguns mesmo desiludidos com o governo, que segundo apuramos para o voto, em 2008, conseguiu fazer deslocar para esta localidade um helicóptero, aproveitaram a presença da imprensa para pedir ao governo do Uíge a resolução de questões como água, estradas, escolas e hospital que a comunidade necessita para o seu desenvolvimento.
Sobre os problemas levantados pela população local, o admi- nistrador da comuna de Macocola, Joaquim Chita, admitiu que não está alheio a realidade daquela povoação, ao mesmo tempo que reconheceu os esforços que têm sido empreendidos pelos Naturais da região.
No entanto, esclareceu que o governo tem prioridades e neste momento a prioridade é melhorar a estrada que liga a capital da província do Uíge a sede da comuna de Macocola. De seguida, as vias secundárias que vão ligar a sede comunal até ao município de Milunga e só depois é que vai olhar para as povoações.
Para o administrador comunal, os estudos feitos chegaram a conclusão que a solução de todos os problemas levantados passam pela reabilitação das estradas. Só assim é que os empreiteiros, professores, médicos e outros técnicos vão poder permanecer em Macocola.
De acordo com Joaquim Chita, os problemas não estão apenas naquela localidade. Em Macocola existem outras que desde as eleições legislativas de 05 de Setembro de 2008, que o MPLA venceu de forma esmagadora a nível nacional com 81 porcento de votos, nunca mais foram visitadas por falta de estrada.
O representante do governo fez questão de frisar que embora se sintam abandonadas não estão esquecidos.
“È um problema que se verifica em todo país e não se resolve num dia”, disse, acrescentando que “as máquinas estão a trabalhar e a seu tempo vamos chegar”.
Pelo menos mais de três mil pessoas, entre crianças, jovens e idosos, foram contemplados recentemente, em Macocola, com cestas básicas, contendo medicamentos, instrumentos de trabalho (limas, machados, catanas e enxadas), material escolar, equipamentos desportivos e brinquedos que foram distribuídos as comunidades dos bairros Boa Esperança, Vila Nova, Cuimba, Quibuca, Tio Manuel, São Paulo, Quinheca, Belo Horizonte e Braga.
Os naturais de Macocola procederam igualmente a entrega de bens alimentares (óleo, açúcar, leite em pó, sal de cozinha, farinha de trigo e massa de tomate), roupas e calçados usados, produtos de higiene, vinho, bem como dois geradores.
Em representação do grupo que efectuou uma excursão à região, Carlos António Maiala "Charles" referiu que a iniciativa inserida nas celebrações do ano novo e do seu programa de apoio aos desfavorecidos, visa incentivar a prática desportiva, agricultura e a educação.
A comunidade ali residente sobrevive de pequenas lavras familiares, de onde recolhem os viveres para o seu sustento. O estado precário em que se encontram “motivou-nos para esse gesto”, sublinhou o porta-voz da excursão dos naturais de Macocola, Carlos António Maiala "Charles".
Para o soba de Kiyeca, Manuel José, as grandes preocupações da comuna são a falta de hospital, meios agrícolas, estradas e escolas. No tocante a educação, os petizes percorrem mais de oito quilómetros a pé para frequentarem o centro escolar mais próximo.
“Esse acto de solidariedade é louvável, espero que continuem com esse trabalho, pois ainda existem muitas pessoas que necessitam de ajuda. E sendo esta a primeira vez que fomos beneficiados, apelo as outras organizações para que sigam o mesmo exemplo e nos ajudem na construção de escolas, hospitais e centros recreativos”, solicitou.
Por seu turno, Francisco Coxe, na sua alocução, assegurou que os Naturais de Macocola “estão sempre disponíveis para minimizarem as dificuldades sociais das famílias e o faz com muito prazer”.
A passagem dos Naturais de Macocola foi marcada pela realização de um culto ecuménico, almoço com a comunidade, bem como de um espectáculo musical onde actuaram os músicos Luck Simmol, Lito Dias, Negrão, Turbo de Almeida, Socorro e outros.
A comuna de Macocola limita-se com a sede do município de Milunga e a comuna do Huamba a leste. A oeste com o município dos Buengas, ao sul com o município de Sanza Pombo e ao norte com o município de Quimbele.
A sua dimensão é de 217 quilómetros quadrados. A população atinge cerca de quinze mil 400 habitantes e vive principalmente de agricultura e caça.

2 comentários:

Anónimo disse...

Será que essa Universidade o próximo ano não terá a cadeira de Psicologia Clínica Gostasria que me respondesse. Obrigada.

ALZF disse...

Adorei saber um pouco mais sobre a terra que me viu nascer,apesar das informações serem muito tristes.Foi bom saber como vive a população aí.